1. |
Mastigador de Crises
02:35
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esconjuro azul claro
duma força sem fatos
ultrapassa os corpos e
memoriza os apóstolos
do pecado. ignoro
o procedimento calmo
e mudo
da culpa
por falta de outro nome
que filtrou-me as palavras
ofertando com murmúrios
grunhidos desavisados
voz que quebra em delírio
incinera-me a fala
e inventário espúrio
é como me escreve
ainda a calma
ordem da ordem da ordem
dos dias a fio
lado esquerdo da aragem
que ao sol matiza
marcas poucas, incontáveis
de tempos sem vida
todo dito diverte:
atribulação infinda
arremessado à memória
esconjuro neblina
confusão de corpos
mastigador de crises
viajante, espectro
apóstolo escuro
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2. |
Alvo
04:32
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não precisa fingir tanto, também
ou tornar os detalhes completamente inviáveis
é fácil dizer que você não tem nada a perder:
você tem um alvo nas costas
às vezes se sentir acolhido
às vezes dormir uma noite do início ao fim
não precisa sempre se expulsar e fugir
porque algumas ruas você já conhece
seu corpo nelas adquire elegância
e algumas pessoas provavelmente te conhecem
pelo passo firme e olhar distante
se você conseguir
não precisa de tanto
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3. |
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eu vestia branco e era
o dia mais quente do mundo
um carro de nove lugares vinha me buscar
você estava lá e era horrível
o carro andando rápido
o sol queimando a pele
um medo oportuno no ar
as pessoas só pediam desculpas
era o dia mais quente do mundo
discutimos por horas sem parar
gastando nossa saliva
era difícil até respirar
no dia mais quente de todos
o suor grudava a camisa, o incômodo em todo lugar
o cruel inerte peso do ar
meus amigos que odiavam estar lá
se voltavam contra mim e tinham razão
eu tentava me esquivar
mas era quente demais e eu estava com raiva
eu odiava você por completo
e esse ódio me mataria por dentro
disse pra um amigo, eu acho
que você está sendo só oportunista
e além disso ingênuo. mas deixa
nós paramos na estrada na frente de um bar
era o dia mais quente do mundo
eu desci apressado do carro num pulo
me doem as pernas
e o branco de tudo chegava a cegar
minhas roupas pesadas e quentes
o aço do carro, quase radioativo
o olhar das pessoas que estavam lá dentro
maltratavam o mundo
vocês conheciam alguém mas eu não
e eu fazia questão de não cumprimentar
eu tentava saber a sua reação
e era um dia tão quente
uma bica de água que pude alcançar com meu passo confuso
a água estava quente
e além disso inconstante em seu fluxo
eu cheguei a querer cair ou deitar
é o mesmo no dia mais quente do mundo
os degraus pro bar eram altos e dois
e me doíam os joelhos
a roupa fazia minha pele queimar
era o dia mais quente do lado de dentro
dois homens jogando uma partida de truco
e um deles dizia, eu vou chamar sua atenção
um cachorro latia e pulava em mim
outro cachorro olhava deitado
eu entrava no bar pra pedir uma água e meus olhos te viam
no dia mais quente que existe
e sentia, esse é meu ponto final
minha pele ardia e parecia emanar
algum tipo de força maligna
quente, pesada, incompreensível
as paredes de cal que entravam na córnea
mesmo depois de fechados os olhos
vocês foram embora e me esqueceram lá
e era um dia bonito
mas também um dia horrível
era o dia mais quente do mundo
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4. |
Pressa e Atraso
02:44
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disperso e desperdiçado
sem tempo, ou foco, ou tato
já existe tanto de tudo
que as vontades se quebram e engolem
na boca de cada um que fala
um veneno latente, um golpe
esse mundo anda escorregadio
e você tem pressa e atraso
cantos selvagens, gritos de guerra
não mudam o silêncio da casa
o nó que os pés fazem, a cabeça baixa
a humanidade da tua herança
disfarça de afeto e convence
esse mundo ainda tem jeito
mas você tem pressa e atraso
o trauma não é seu, é cósmico
os gestos se fecham e resolvem
sozinhos a grande pergunta: qual
nome entre os nomes abstratos
agora te foge à memória?
você não fala mais quase nada
e eu tenho pressa e atraso
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